19 outubro, 2010

MEU VOTO APAIXONADO

Como já tinha contado, votei na Marina. Fui recompensado então com a ida dos dois candidatos mais votados para o segundo turno. A recompensa, pensei, será o enriquecimento da experiência democrática brasileira. Não sei por que nunca perco a esperança de que um dia iremos aprender a usar melhor a democracia representativa de que dispomos. Essa é uma esperança meio forçada mesmo, já que os dois principais candidatos representam os dois grupos que se revesam no poder executivo federal nos últimos 16 anos sem terem tomado uma única medida para melhorar a qualidade do nosso voto. Explico: nesses últimos 4 governos, dois do PT e dois do PSDB, nada foi feito para que o voto deixasse de ser obrigatório; o povo não foi esclarecido que o dinheiro que paga obras, o bolsa família, ou é surripiado pelos corruptos, vem do seu próprio bolso; os votos continuam a ser captados segundo os mandamentos do famigerado marketing político e não como fruto de uma análise conjuntural, política e social bem fundamentada (isso sem falar dos modernos currais eleitorais e da compra de votos). Claro que essa lista não se esgota com esses três exemplos, mas acho esses os mais importantes.

Diante desse quadro, me restou votar na Marina no primeiro turno. Confesso que esse voto foi mais para evitar os antipáticos Serra e Dilma, cujos sorrisos insinceros e sem jeito não passam de um cumprimento de ordem dada pelos nefastos marqueteiros. Agora não tem jeito, tenho que escolher o menos ruim, e os dois são péssimos. Se eu fosse aqui analisar cada ponto negativo do tipo de governo dessas duas turmas, isto não seria um blog mas um tratado, e este não seria um post mas um tomo. Então, vou me concentrar em um, que acaba sendo a causa de todos os outros: a sede de tomar e/ou manter o poder. O que vale é conseguir votos para ter, ou manter, o poder. Nessa sanha os candidatos passaram a atacar o telhado de vidro um do outro, é pedra pra todo lado. Serra acusa Dilma de ser a favor da legalização do aborto; Dilma diz que Serra é da turma das privatizações. Entremeando as pedradas e os cacos de vidro os dois declaram uma ou outra “proposta” que não passam de monumentos ao óbvio: “a atenção à gestante vai ser melhorada no meu governo”, “vamos criar mais vagas nas escolas públicas na minha gestão”. E eu, na minha santa ingenuidade, achando que o debate político seria enriquecido no segundo turno.

Mas o que mais preocupa é o reflexo que o comportamento desses candidatos causa em parte do eleitorado: a paixão. A esta altura o que importa é defender com ardor o candidato em que se vai votar. Meu amigos “Dilmistas” dizem que o Serra vai devorar a Petrobras como se fosse um terrível monstro marinho; os “Serristas” dizem que a Dilma é uma guerrilheira sanguinária que quer implantar o comunismo no Brasil. Assim, a democracia transmuta-se numa competição de torcidas organizadas, onde cada lado brada que é melhor que o outro enquanto a razão e a democracia calam-se perplexas por estarem sendo desperdiçadas em prol da ganância de poder dos candidatos e dos grupos que esses representam. Quanto a mim, não esperem a defesa do candidato que escolhi nem a demonização daquela pela qual não optei, já que, diante desse triste quadro, meu voto será dado, sem nenhum entusiasmo, pelo minguado motivo de que é salutar, numa democracia, a alternância de poder.

18 agosto, 2010

TEM QUE SER O SERRA!

O título deste texto não se refere ao meu voto, sou eleitor da Marina Silva. Esse título é por causa de uma imposição de José Serra (ao que parece perpetrada por ele mesmo), como candidato à presidência pela corrente política adversa à de Lula (só Deus sabe o que seria esquerda e direita hoje no Brasil). Sempre tive comigo a ideia de que nosso atual Presidente elegeu-se, em parte, pela insistência. O simpático sujeito de barbas brancas que se identifica com o povo falando errado, num sublime trabalho de afirmação da enorme ignorância de ambos, já teve altos índices de rejeição. Me lembro de sua primeira candidatura em 1989, a lapidação pela qual passou o “sapo barbudo” (Brizola lhe conferiu a alcunha), é notável. Talvez seja esse o caminho do Serra.

E por que não o Serra? Aécio Neves seria melhor? Tanto faz. Não há mais divergências profundas entre as duas correntes que disputam a presidência. O último a desfrutar dessa mentira ridícula foi o próprio Lula. Ele seria o homem do povo, chegando ao poder pelo povo, para governar para o povo. Seria, não foi. Mostrou-se verdadeiramente: é o homem de um grupo político que almeja o poder, que chegou ao poder enganando o povo, e governou para manutenção do seu grupo no poder. E continua muito eficiente nesse desiderato de enganar para continuar mandando.

E agora estamos vendo o Serra no mesmo processo pelo qual passou Lula: se amoldando na tentativa de tornar-se presidente. Mas como chegar ao poder sem dançar conforme a música? Como esperar que a parcela da população que tem a maioria dos votos possa discernir propostas distintas se essas não existem? E se existissem estaria o povo interessado nisso? Claro que o povo não quer saber de propostas, quer saber de “bolsas” e de votar segundo suas paixões. Então, será isto que veremos neste 2010 com eleições, um insistente sósia de Nosferatu realizando malabarismo de marketing político, com medo de atacar o superpopular Lula e assim malograr seu intento de levar ao poder o grupo político que representa. Espero que um dia possamos usar melhor a democracia.

06 junho, 2010

GALALAUS AZUIS E FILMES PORNÔ

A tecnologia atual encanta os olhos. Não só os olhos, é verdade, mas a visão é sem dúvida a “vítima” dos maiores deslumbres. Eu me lembro bem quando tive a nítida impressão (e como era nítida!) de ter avistado Will Smith no interior de uma loja de eletrônicos. Demorou um segundo para eu entender que todo aquele realismo não passava de uma cena de Homens de Preto, sendo exibido numa televisão de plasma (realmente não era LCD, e as de LED ainda não tinham sido lançadas). Então, substituí o impulso de entrar e tentar pedir um autógrafo pela curiosidade acerca do equipamento que gerava uma imagem tão nítida, tal límpida, tão real, tão tão. Explicações dadas pelo vendedor, saí da loja cogitando em quanto tempo toda aquela maravilhosa tecnologia HD estaria ao alcance de um integrante da classe média como eu.

Essa é uma face do deleite visual que a tecnologia nos proporciona, a outra são os efeitos visuais que os hiper-super-mega-computadores da indústria do cinema produzem. É sensacional. Não fossem essas máquinas de produzir realidade, jamais poderíamos ter visto com tamanho realismo o Homem-Aranha dando uma de Tarzan urbano, indo e vindo, pendurado na sua teia, entre os espigões de Nova Iorque. Como realizar tantos filmes de heróis dos quadrinhos com tamanha qualidade sem esses equipamentos? Maravilha, podemos assistir essas dádivas que o cinema produz nas nossas salas de estar, e em alta definição. Quem poderia ser contra isso? Eu não sou.

Tudo estaria perfeito não fosse o uso indiscriminado do que apelidei de “receita de filme pornô”. Para fazer um filme pornô basta ter casais fazendo sexo explícito, o resto fica por conta de uma mínima técnica cinematográfica. Entre uma cena de transa e outra insinua-se um roteiro que não passa de uma desculpa, uma lenga-lenga que depois do advento do vídeo-cassete é assistida muda e em alta velocidade: tudo o que interessa ao tarado que alugou o filme são penetrações, gemidos e olhos revirando. Infelizmente, parece que a indústria do cinema acha que tudo que interessa ao público de hoje são imagens impactantes, seja pela beleza, seja pela grandiosidade. Avatar e 2012 são claros exemplos disso. Para entender o que eu estou dizendo, basta suprimir os índios interplanetários azuis e todo o maravilhoso mundo visual que os cercam e olhar para o que sobra de Avatar. Depois que fiz isso descobri que o tema já fora abordado com muito mais qualidade e propriedade em Dança com Lobos. Já 2012 nada mais é do que o velho e péssimo cinema catástrofe, onde os personagens principais se cansam de escapar fedendo (que é sempre melhor que morrer cheirando, tenho que admitir), em meio a “pancadas visuais” aterrorizantes. Só resta fazer uma coisa em relação a tais filmes, onde a razão de ser é a indiscutível beleza de galalaus azuis pisando em mato que se acende, ou a impactante visão de uma onda tão gigantesca que joga um porta-aviões sobre a Casa Branca: usar a tecla de avanço rápido para saltar a lenga-lenga e satisfazer essa nova espécie de tara visual.